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5 de abril de 2016

O mundo é quadrado

Meu mundo é quadrado, eu vejo ele da janela do quarto, e ainda tem uma rede que me separa do céu. Às vezes vou mais além, vejo um documentário sobre crianças carentes ou o universo observável,  em telas de celular e monitores. Quando cansa os olhos, leio um livro, ele é quadrado também.

Vemos quadrado, vivemos quadrado.

A gente sai da festa e vai para um mundo plano que seguramos na nossa mão. Saímos das aulas, das fofocas, perdemos as piadas,   saímos dos aviões e das ruas e fomos pro street view.

A gente nunca mais perdeu a receita do bolo e acabou comendo só a calda, porque ele não cresceu, não podemos reclamar que deu tudo errado no banco, ao menos que a internet caia, nem a voz da atendente do delivery a gente ouviu mais. A gente nunca mais ficou perdido em um rua desconhecida, rindo loucamente porque não sabia voltar pra casa, o waze mostrou o caminho.

O que a gente perdeu mesmo foram algumas horas de vida nesse mundo, que devia ser redondo e louco, que devia ser criptografado sim, mas não em código binário, que devia nos deixar sem fôlego por ser grande  demais e cansar os pés, não a mão que segura o mouse.

E quando a vida nos atingisse, como um tijolo, com perguntas, dúvidas e incertezas, não seria para as telas quadradas que correríamos.


Copérnico, Giordano Bruno, Galileu, todos eles já sabiam. A resposta está das curvas.

3 de abril de 2016

Júri


Meu palco é um monólogo, o que você vê, e o que você ouve, é só unidade. Meu espetáculo é silêncio,  e o que escuta, são ecos do vazio. Minha peça é escuridão, e  o que  eu enceno, é  a solidão.

  O que você não vê, são os demônios nas minhas costas e as correntes em minhas pernas. 

Do seu assento confortável você não ouve os gritos sufocados com o pano das cortinas.Embaixo da lona desse circo você desconhece a cor do meu céu e não percebe o passar dos meus dias.

Você não vê as feições por de trás das máscaras, nem aqueles que me passam a roupa para eu entrar em cena, não vê a cama e nem os monstros embaixo dela, sua cadeira está distante demais pra enxergar a pequenez de uma lágrima e você  distraído demais pra perceber o rio que ela forma. Você desconhece a mim por detrás do personagem que incorporo, você não vê nada, além do que eu mostro. 

Eu sei que julga os meus passos, pois soam.perdidos, mas você não vê o sangue da sola dos meus pés no chão.


Minha voz soa arrastada, mas você não ouve a rouquidão. 

Meus olhos parecem cansados, mas você não estava lá durante a noite pra  me ver revirar e perder para a  insônia. 

Meu roteiro é a dor, mas minha dor é poesia e você está perdido demais pra encontrar a rima.